Imprensa e governabilidade na era da
incerteza informativa
Por Carlos
Castilho em 03/03/2015
O mês de março
surge como um perÃodo de considerável turbulência polÃtica que aumentará a
incerteza na população, já que a radicalização partidária e ideológica tende a
polarizar a informação publicada, levando as pessoas a se agarrarem cada vez
mais às versões e opiniões similares às suas escolhas individuais.
Neste quadro, a imprensa está associada à polarização e à radicalização das opiniões e atitudes porque aumentou, e vai aumentar ainda mais, o papel da informação na forma como as pessoas entram em contato com a realidade que as cerca. Em épocas anteriores, quando reinava a escassez de informações que se concentravam em poucos veÃculos jornalÃsticos, o isolamento da realidade era maior, mas a alienação não chegava a ser insuportável porque a uniformidade noticiosa gerava apenas duas posições: contra ou a favor. Aceitava-se uma ou outra atitude, sem muita possibilidade de questionamentos por falta de recursos informativos.
O que se observa hoje é um fenômeno novo provocado pela abundância de fatos, dados, eventos e versões na internet, bem como a diversificação de fontes, porque o acesso à arena informativa foi consideravelmente democratizado. O elemento inédito na crise atual é a crescente confusão e desorientação de consideráveis segmentos da opinião pública que convivem com a perplexidade, quase permanente, de notÃcias contraditórias circulando tanto na imprensa convencional como nas redes virtuais.
Março de 2015 começou sob o impacto dos bloqueios de estradas por caminhoneiros e deve registrar um gradativo aumento da tensão polÃtica com a manifestação do dia 13 em defesa da Petrobrás e do protesto marcado para o dia 15, cujo objetivo é criar condições para o afastamento da presidente Dilma Rousseff. O caso dos caminhoneiros já forneceu os elementos mÃnimos para indicar que estamos no meio de uma batalha da informação, onde não existem mais apenas dois lados.
Nossa cultura
passada nos empurra para a velha dicotomia entre bons e maus, amigos ou
adversários, mas a nova realidade da internet nos choca com uma avalancha de
dados, fatos, eventos, opiniões e versões que desafiam a nossa capacidade de
entender a realidade e nela nos situar. Diante da incerteza e da insegurança,
surge uma forte tendência a buscar refúgio nas condutas e esquemas mentais que
consideramos seguros.
Ao receber uma
notÃcia, o individuo quase sempre a situa no seu próprio contexto antes de
tentar examiná-la de forma mais isenta. Quando a informação contradiz as ideias
do receptor ele tende a rejeitá-la, o que cria de imediato uma situação de
confronto com os que a aceitaram. É mais ou menos o que estamos vivendo hoje na
realidade brasileira. Tendemos a julgar um dado mais pela pessoa ou instituição
que a produziu ou divulgou do que tentar situá-lo no contexto do paÃs.
A imprensa tem
um papel crucial nesse processo porque ela é a responsável pela alimentação da
agenda de debates do público, tanto através da mÃdia convencional como nas
redes sociais. A alegação de que os jornais publicam e cabe ao leitor fazer o
julgamento já não pode mais ser tomada ao pé da letra porque isto se tornou
inviável tanto pela complexidade crescente dos fatos, dados e eventos
noticiados como pela escassez cada vez maior de tempo dos indivÃduos para
contextualizar o que recebem pela imprensa.
A avalancha
informativa gerada pela internet modificou o processo de incorporação de dados
novos (notÃcias) ao mapa mental dos indivÃduos. Quando a informação era escassa
e o compartilhamento entre pessoas era pouco intenso, a incorporação podia ser
sequencial e linear, baseada na avaliação de causas e efeitos. Na era digital,
o processo passou a ser semelhante à captação de fotografias da realidade que
se acumulam na memória de curto prazo das pessoas e geram percepções e opiniões
baseadas em correlações entre os dados captados por meio da imprensa e dos
compartilhamentos interpessoais.
Se antes
nossas opiniões eram geradas essencialmente pela dedução (causa e efeito),
agora elas se formam pela indução – ou seja, simplificadamente, pela relação entre
fatos, números e eventos. Esta mudança aumentou a responsabilidade da imprensa
na publicação de notÃcias porque as pessoas já não têm mais condições de pensar
antes de absorver uma notÃcia. Ela é captada pelos sentidos humanos, cada vez
mais por imagens e sons, e a primeira filtragem é a da emoção quase sempre
fundamentada em pré-conceitos.
Toda esta
reflexão é para mostrar a vocês leitores como a imprensa tem uma grande
responsabilidade no desenvolvimento de um clima de polarização emocional de
opiniões e atitudes na conjuntura polÃtica nacional. A imprensa pode
intensificar ou atenuar a polarização porque é ela que alimenta quase 90% do
fluxo de notÃcias que circulam no ambiente social contemporâneo.
A imprensa vem insistindo na apresentação de um quadro pessimista e depressivo na realidade polÃtica, econômica e social do paÃs, gerando um desconforto e insegurança na população que tendem a minar as bases da governabilidade no paÃs. A incerteza informativa está obrigando o brasileiro a conviver com uma realidade nova em matéria de crises polÃticas nacionais: o enfraquecimento da, outrora definida, linha divisória entre os bons e os maus, amigos ou inimigos, honestos e corruptos.
A imprensa vem insistindo na apresentação de um quadro pessimista e depressivo na realidade polÃtica, econômica e social do paÃs, gerando um desconforto e insegurança na população que tendem a minar as bases da governabilidade no paÃs. A incerteza informativa está obrigando o brasileiro a conviver com uma realidade nova em matéria de crises polÃticas nacionais: o enfraquecimento da, outrora definida, linha divisória entre os bons e os maus, amigos ou inimigos, honestos e corruptos.